ENTRE VIOLAS E VIOLINOS

            Viola, Saúde e Paz!

É bem provável que sejamos os únicos no mundo a estudar as violas dedilhadas brasileiras a partir da contextualização com a História dos Cordofones Ocidentais.

Esta frase te incomoda, talvez até te irrite um pouco? Parece muito pretenciosa? Não se preocupe tanto, ela é mais marketing que outra coisa. O objetivo é atrair para o que escreveremos a seguir: pedimos um pouco de paciência, um voto de confiança, que explicaremos.

A afirmação é atrevida, entretanto, não é mentirosa, sequer exagerada: circunstâncias que a maioria parece ainda não saber a tornam até óbvia, só que são necessárias algumas palavras a mais que uma simples “manchete” para explicar…

Primeiro que, no mundo ocidental, basicamente só duas culturas teriam tido até hoje interesse em estudar violas dedilhadas: as de língua portuguesa, em especial Portugal e Brasil (pela obviedade de que nestes países há violas dedilhadas até hoje) e as de língua espanhola, mas parcialmente, por causa das vihuelas que teriam caído em desuso a partir do século XVII. Teria havido violas dedilhadas em território italiano, pelo menos nos séculos XIV e XV (ver, das referências, Boccacio e Tinctoris), mas não encontramos estudos sobre elas. Em mais de uma centena de fontes das principais línguas ocidentais desde o latim antigo, se muito, encontramos umas cinco frases (!) sobre violas dedilhadas brasileiras e portuguesas. Concluímos, portanto, que o mundo praticamente desconhece nossas violas, mas nós resolvemos estudá-las com base em estudos mundiais sobre cordofones, por isso, já saímos na frente.

O fato é que portugueses e brasileiros não teriam publicado estudos nos quais demonstrem ter feito paralelos entre a História dos Cordofones e as nossas violas, principalmente nos aspectos histórico-sociais e seus impactos. Um destes impactos são as variações dos nomes dos cordofones pelos séculos, estes pouquíssimo estudados. Entenda-se bem: portentosas (e, merecidamente, respeitadas) pesquisas como a do português Ernesto Veiga de Oliveira, da década de 1960, citam alguns nomes em outras línguas, mas sem aprofundamentos, chegando a considerar instrumentos bem mais antigos, e com nomes bem diferentes, como sendo simplesmente “violas” (o nome “moderno” que em português só tem registros conhecidos a partir do século XV). Sim, hoje podemos afirmar que existiram instrumentos chamados “viola” (e variações próximas em diversas línguas deste nome original em latim) desde o século XII, mas com quase nenhuma descrição sobre detalhes dos instrumentos: daí, até afirmar-se que violas sempre teriam existido, e da mesma forma, em terras lusitânicas, há um abismo de desenvolvimento e atestação científica não apontado. E pior: nós, que partimos de observações de algumas pesquisas também muito portentosas, porém de dezenas de autores em diversas línguas, sobre todos os instrumentos, desenvolvemos que não é assim que os nomes deles vêm se comportando desde os mais remotos tempos.

O melhor é que ao estudar a História dos Cordofones nos deparamos com a História toda até os dias atuais, seus curiosos e específicos aspectos sociais, os paralelos com as diversas línguas / culturas… Muitas coisas interessantes, úteis e pouco citadas!

Uma exceção que precisamos apontar é o doutoramento da espanhola Dra. Rosário Martinez, já da década de 1980: este abrangente e portentoso estudo sobre os cordofones na Idade Média é um dos poucos que apontam preocupação e estudos sobre as variações dos nomes nas diversas línguas envolvidas. Além de vasto banco de dados de registros escritos, incluindo manuscritos, também é expressivo o número de registros a partir das artes plásticas, como esculturas, desenhos, iluminuras, pinturas e similares. Alguns contextos históricos-sociais são citados, porém poucos, indicando que não fizeram parte expressiva da equação investigativa. É ótima fonte sobre as vihuelas, sobretudo pelo contexto com os demais cordofones, mas sequer cita as violas dedilhadas portuguesas e brasileiras. Por outro lado, estudiosos brasileiros e portugueses raramente citam a boa pesquisa da espanhola (entendemos que, como nós, deveriam é seguir o exemplo e até ampliar o leque de bases daquela).

Já deu para entender porque então aproveitamos as circunstâncias para “puxar a brasa para nossa sardinha”? Não é, nem de perto, tão genial e inovador quanto a invenção da roda, por exemplo: mas é um aprofundamento bem sério sobre como o Ocidente tem estudado instrumentos nos últimos séculos e, com a soma das melhores ferramentas encontradas, estudar instrumentos que ainda não teriam sido estudados.

Bom… agora que esperamos que não nos ache arrogantes (só “espertinhos marqueteiros”), vamos ao tema de hoje, que já ensaiamos parcialmente pelas redes sociais e citações feitas em nosso livro A Chave do Baú. Aqui, entretanto, nos propomos tentar ser muito, mas muito mais profundos e detalhados, talvez, que qualquer outro estudo ocidental já publicado (sim, seguimos abusando das circunstâncias, a propaganda não é a alma?). Estes Brevis Articulus semanais são para isso, aprofundamentos; e também os aproveitamos para tentar fomentar o gosto pela leitura, pela valorização de descobertas científicas e pela preservação de nossos Patrimônios (no caso, Patrimônios não apenas as violas, mas também a inteligência, a sagacidade, a capacidade dos brasileiros).

Como falamos pouco deles por aqui, vamos primeiro introduzir os violinos: são cordofones de porte pequeno, com braço, caixa cinturada com desenho e furos estilizados, fundo plano, tocados a maior parte do tempo pela fricção de um arco. Os mais numerosos nas orquestras, tem hoje distinção de importância: o líder dos violinistas, chamado spalla, é normalmente o segundo na hierarquia após o maestro, e o “naipe”, quer dizer, o conjunto dos instrumentos similares, diferentes praticamente só pelos tamanhos, é convencionalmente chamado “família dos violinos” (contrabaixo, violoncello, viola e o violino, claro).

Respeitamos a consolidação, embora não concordemos com este nome “família dos violinos”: não deveria, pois o grupo surgiu após e em função das violas (“violino”, em italiano, significa “pequena viola”). A “família das violas de arco” (melhor dizendo, então, mas com aspas) têm os mais remotos registros conhecidos na península hyspanica, sob nome de VIHUELAS, quando ainda era nome tanto de instrumentos friccionados por arco quanto dedilhados. Dedilhados, no caso, podem ser diretamente pelas pontas dos dedos, ou unhas, ou plectros, que são pequenos objetos como as palhetas modernas usadas em guitarras elétricas.

Mais remoto registro conhecido do nome VIHUELA seria no Libro de Apolônio, de autores desconhecidos, estimado ao ano de 1240, onde também haveria variações como VIUELA e VIOLA, dependendo do códice/manuscrito analisado. Variações próximas (VIHOLA, VIOLA, VIEULA) constariam alguns anos antes no poema Daurel et Beton (também sem autor conhecido), escrito em occitano, língua surgida a partir do latim popular e antecessora dos atuais espanhol e português (tudo isso pode ser conferido, por exemplo, mas não apenas, no já citado trabalho de Martinez, de 1981).

VIOLA, como dissemos, teria registros desde o século XII em textos em latim (Codex Calistinus, estimado entre 1130 e 1160), logo em seguida em occitano, catalão e até em espanhol mesmo. As evidências são de que fossem instrumentos de tamanho maior que os atuais violinos. De maneira geral, todos os cordofones teriam evoluído com o tempo a partir de três cordas, depois quatro, cinco, etc. Uma das melhores fontes para perceber isso é The History of Musical Instruments, do alemão Curt Sachs, de 1940.

O termo violines (em texto em anglo-saxão, antecessor do atual inglês) teria registros pelo menos a partir do século XVI, na publicação Sheperd’s Callendars, de certo Edmundo Spencer (segundo pesquisas de Carl Engel, do livro Early History of Violin Family, de 1883). Já “violino”, propriamente dito, teria vários registros a partir do século XVII: em latim, por Michaele Prӕtorio (Syntagmatis Musici, de 1615) e Athanasius Kircher (Musurgia Universalis, de 1650). Já escrevendo em inglês, John Playford (em A Brief Introduction to the Skill of Musick, de 1667), chamou de treble-viol (“viola aguda”), o que, pelos registros em pauta, já seriam “violinos”; entretanto, antes e como ele, vários se se equivocaram em apontar lyra-viols como “violinos”. Aquelas, assim como as chamadas “liras bizantinas”, não teriam corpo cinturado, além de terem sido um pouco maiores, como as violas.

Destacamos, por haver muitos apontamentos equivocados, que haveria instrumentos similares antes, mas que não seriam violinos pois só podem assim serem considerados os de caixa cinturada. Mais que uma simples variação, que nem tanto altera a sonoridade final, as caixas cinturadas se tornaram a escolha europeia, claramente em concorrência (ou resistência) aos abaulados e periformes instrumentos dos invasores mouros. E por nossas pesquisas serem bem amplas, mais atenção chamamos para um fato: entre o surgimento do nome e a consolidação do violino como hoje o conhecemos há um período de cerca de 300 anos (!). Muitos não atentam para este importante período.

Outro equívoco comum, cuja origem vem de textos em francês, é considerar o termo violon, introduzido por Marin Mersenne (em Harmonie Universelle, de 1636) como modernos “violinos”. Realmente o termo veio a ter este significado, porém depois. Considerar o termo violon daquela época como “violino” é ver o passado com visão do presente (erro grave). Mersenne, de fato, usou o termo como proposta de subdivisão de friccionados por arco, entre violes (mais graves) e violons (mais agudos): genéricos, inventados, mais uma vez atrapalhando os estudos posteriores, como acontece muito. Hastag “pelo fim do uso de nomes de instrumentos como genéricos”. Seria tão melhor se este senhor tivesse escolhido “gravon” e “agudon”, por exemplo… Minha mãe dizia que “Deus não dá asas a cobras”, mas às vezes duvidamos. Só um pouco…

Apesar de, portanto, já existir como nome, o violino só viria a se consolidar a partir da segunda metade do século XVIII, após longa fase de transição que normalmente não é citada em detalhes pelos que se aventuram a escrever (talvez, para economizar palavras?). Entretanto, é uma grande fase (ou a soma de fases menores) de transição que, de fato, apontam e descrevem a verdadeira origem dos violinos.

Sem preguiça, o começo do começo seria: as mais remotas lendas (argh…) remontam a desenhos das cavernas que supostamente representariam arcos de caça como instrumentos musicais… (Será que os trogloditas tentavam matar animais tocando muito mal? Só pode). Depois, a lenda de Ravana (legendário Rei de Ceylan, na Índia, aproximadamente 2000 aC.) também evoca um arco como de instrumento musical entre imagens de elefantes enormes com diversos braços… (Sem comentários). Depois, nos sincretismos mitológicos greco-romanos (que tentavam “retraduzir” lendas de vários povos invadidos), talvez Apolo ou Mercúrio fosse o inventor…

[Na boa? Uma canseira esse negócio de “lendas e mitos”, que tantos gostam de citar para impressionar e “vender” conhecimento fútil como se fosse Ciência, como se fossem verdades… Só “confunde a bagaça”, na verdade, e são os mais citados e “gostados”!].

Fato, de fato, é que se arcos chegaram ao território europeu a partir do século VIII com a invasão moura/muçulmana, só teriam registros conhecidos a partir do século X. Registros escritos, desenhos e esculturas apontados por estudiosos que teriam vasculhado tudo quanto é museu e peça pública por lá. Na sequência vamos dar as referências de alguns destes estudiosos, em estudos publicados em diversas línguas (como Engel, Sachs, Garnault, Martinez): duvidem e chequem, pois esta informação, de atestamento só a partir do século X parece ser pouco conhecida até por estudiosos atuais.

Instrumentos cujos nomes árabes seriam próximos a rabab / rabeb (“rabecas”) podem, portanto, ser considerados os primeiros a terem registros como sendo tocados por arcos em território europeu, mas é bom atentar que eles teriam sido tocados tanto “com” quanto “sem” arco, tanto é que instrumentos bem similares eram chamados mandura e seriam dedilhados (ver em mais de um artigo da Encyclopedie de la Musique, de 1925).

A bivalência (mesmo nome de instrumento tocado de duas formas), pouquíssimo citada em estudos, teria sido encampada por instrumentos europeus antes apenas dedilhados, formando um trio de ancestrais que entendemos ser melhor apontar por seus nomes mais remotos: além do rabab (árabe), a giga e a rota (estes dois últimos, em latim). Entretanto, os grandes estudiosos que citamos, (os tais “vasculhadores”), acharam por bem traduzir estes nomes em seus apontamentos. João Araújo, que atrevidamente está a questionar estes e outros comportamentos, alerta que traduzir e/ou assumir nomes genéricos modernos para instrumentos antigos é um grave equívoco, mas é importante respeitar a forma que aparecem nas, sem dúvida alguma, sérias e bem embasadas pesquisas:

rotte, geige, rebec – em inglês, por Carl Engel, em Early History of Violin Family, de 1883;

crowth, gige, rebec – em alemão, por Curt Sachs, em Real-Lexikon der Musikinstrumente, de 1913;

crouth, gigue, rebec – em francês, por Paul Garnault, na Encyclopédie de la Musique et Dictionnaire du Conservatoire, de 1925;

rota, giga, rabé – em espanhol, por Rosário Martinez, na tese Los instrumentos musicales en la plástica española durante la Edad Media, de 1981.

Como já explanado, nenhum destes acima seriam ainda “violinos”. A partir do século XII começariam surgir evoluções deles com nomes próximos ao termo “viola”, variações como: VIOLA, VIELLA, PHIALA, FIGELLA (em textos em latim), VIOLLE, VIELE (em francês); FIDIL / FIDLI (em irlandês), VIDELE, FITHELE, FIDELE, PHIGILE, VIGELE (em variações de dialetos alemães), VIOLA (em catalão e occitano) e VIHOLA, VIEULA (também em occitano) – isso para citar apenas variações semelhantes observadas até o século XIII (!). E sim, pode-se dizer que aqui “o buraco é mais embaixo”, e mais profundo, em quantidade de dados, por isso somos tão atrevidos, espertinhos, provocadores…

A mais remota citação de uso de arcos, nas então “violas”, seria do século XIII, pelo manuscrito Summa Musicӕ, creditado a certos “Perseus e Petrus”. Em latim, arcus dat sonitum phiale – porém, na mesma frase o instrumento teria sido descrito como rotule monochorde, então a tradução completa seria “O arco [é usado para] gerar som na phiala, um monocórdio com roda”. Este mesmíssimo texto, além de interpretações similares, teria sido replicado por séculos, tendo sido inclusive “creditado” a outros autores… Resultado? Vários estudiosos ainda sustentam que, por isso, phiala teria sido “viola”, e que seria tocada só por arco, por todo o território europeu, “pelos séculos e séculos amém”. É a questão de desconhecimento da possibilidade de violas dedilhadas, e de estudar e descobrir que um nome pode significar algo diferente em cada língua.

É também um grande equívoco. Talvez por confundirem com a organa, que neste caso não poderia ter sido “monocórdio com roda”. Ela realmente teria sido ancestral dos friccionados: cinturada, tocada por uma manivela, esta que girava uma roda, e aquela roda friccionava cordas. Só que a organa não teria tido descrição, nem faria sentido, ter uma corda só (conforme já desenvolvemos aqui em outro Brevis Articulus). E pior: teriam existido instrumentos monocordes, tocados por arco, mas tão grandes (cerca de dois metros de comprimento) que as citadas “rodas” então serviriam para locomoção. Aquelas phialas teriam sido “trombas / trombetas marinas”, citadas pelos pesquisadores acima e outros conforme suas línguas (trumscheit / trumbscheit em inglês e alemão, monochordo em latim e italiano, marine trumpet em inglês, trompette marine em francês, trompeta marina em espanhol). Para confundir mais um pouco os menos atentos, o mesmo nome seria citado depois também para um instrumento de sopro, por Virdung (em 1511) e Bonanni (em 1722).

Violinos teriam começado a surgir após clara fase de transição iniciada na península itálica, onde são observadas propostas de classificação das “violas”, após inicialmente serem conhecidas por lá por dois tamanhos: da braccio (“de braço”) e da gamba (“da perna”, indicando serem estas maiores). Esta fase, entretanto, só fica bem clara ao analisarmos o histórico de registros em várias línguas e épocas, por autores que entendiam e praticavam música, instrumentos musicais (faz diferença).

Depois de Johannes Tinctoris, que ainda identificava “violas” em Napoli tanto como cum arculo como sine arculo, mas as diferenciava das rebecum (“rabecas”) pelo fundo plano e formato cinturado de caixas (inclusive confessando serem ambos instrumentos que preferia tocar, conforme seu De inventione et uso musicӕ, ca.1486), seguiriam os registros de época que apontam mais de 100 anos de caminhos trilhados bem antes da atual classificação (considerar sempre do mais grave ao mais agudo dos instrumentos):

– a proposta de Martinus Agricola (Musica Instrumentalis, 1529), que em texto em alemão considerava todos friccionados como “geige” (genérico, a partir das gigas antigas, lembra?) e onde já se via a comparação com a classificação de vozes dos coros: bassus, tenor, altus, discantus;

– a proposta de Giovani Lanfranco (Scintille di musica, 1533), que em italiano as considerava todas como “violetta da braccio e da arco”: violono, violone, violoni (os mais graves) e basso, mezzana, canto (os mais agudos);

– a proposta de Silvestro Ganasi (Regola Rubertina, 1542), também em italiano: basso, tenor, alto, soprano;

– a já citada divisão de Mersenne, em 1636, em francês: violes e violons;

– a proposta apontada, inclusive por desenhos, por Athanasius Kircher (Musurgia Universalis, 1650), que em latim considerava todos como “chelys” ou “viola”: dodecachorde, hexacorde, maioris ou violone, minor, linterculus;

– a proposta de Christopher Simpson (The Division-Violist, 1659), em inglês: consort-basse, viol e lyra-viol;

– a proposta do citado John Playford, em 1667, em inglês: basse-viol, tenor-viol e treble-viol.

Além de não se observar um consenso, como dissemos cada autor traduzia ou inventava para suas línguas os nomes, o que facilita confusões até os dias atuais. Nenhum dos instrumentos acima pode ser considerado como o “violino” moderno, mas muitos equivocadamente assim apontam. Bem depois, mas ainda numa fase final do período de transição, antes da consolidação, teria havido clara disputa de espaço entre violinos e diversos outros instrumentos menores que as violas da época, no início do século XVIII. Esta fase foi apontada por alguns estudiosos, sendo o mais completo apontamento que observamos pelo já citado Paul Garnault, em 1925, que em francês listou e detalhou as diferenças entre: Viola di Bordone, Fagotto, Baryton de viole, Viola di Pardone, Viola Pomposa, Viole d’amour, Quinton, Pardessus de viole e Violettta marina.

O último nome citado não deve ser confundido com a Trombeta Marina citada antes, mas pode ser que o sobrenome tenha sido por inspiração nele. Segundo pesquisas da Dra. Martinez, “marina” não se referiria a “do mar”, mas aponta ter sido a partir de “de Maria”, pelo uso por freiras, religiosas que seriam “filhas de Maria”.

Violetta Marina (em italiano) ou English Violett (em inglês) aponta capítulo especial ao fim da fase de transição, ainda antes da consolidação dos violinos, ao qual fomos mais a fundo por termos detectado informações desconexas nos estudos. A criação é creditada ao músico italiano Pietro Castrucci (1679-1752), em período que este teria trabalhado em Londres (por isso o nome bilingue) como líder da orquestra do compositor alemão George Frideric Handel. Handel teria utilizado o novo instrumento a partir de 1730, assim como Johan Sebastian Bach. Violetta também seria “diminutivo de viola”, em italiano, e é talvez o campeão em equívocos de estudiosos. Entendemos que confundam porque elas utilizariam “cordas simpáticas” (isto é, cordas extras, que vibrariam junto com as cordas normais sem serem tocadas diretamente), assim como as Violas d’Amore, mais antigas. Entre as inúmeras fontes que pesquisamos, nesta que aparentemente é descoberta inédita nossa (detalhada em outro Brevis Articulus, específico) apenas Joseph Majer (Music Saal, 1741) teria atentado que, embora ambas utilizassem cordas simpáticas, violetta não seria exatamente uma viola d’amore, pois as distinguiu em alemão como Violinen (“violino”) e Brazzen oder Violen (“viola de braço”).

Na verdade, violetta não teria sido nem viola d’amore nem viola: seria menor… Mas não ainda como o violino. Entretanto, poucos indicam perceber estes tipos de pormenores, principalmente quanto a desenvolvimento específico de nomes de instrumentos, assunto ao qual nos dedicamos. É por isso que desenvolvemos, aprimoramos e divulgamos com ênfase nossa metodologia, nossos estudos inéditos que atrevidamente se propõem até revolucionários (e haja brasa…).

Portanto, só da segunda metade do século XVIII para cá teria ocorrido a consolidação não apenas dos violinos, mas de praticamente todos os cordofones como hoje os conhecemos. Não por coincidência, teria sido em paralelo com a consolidação das fases da Revolução Industrial… Mas aí já são outras prosas…

Muito obrigado por ler até aqui… E vamos proseando!

(João Araújo é músico, produtor, gestor cultural, pesquisador e escritor. Autor do livro A Chave do Baú, cujos aprofundamentos aponta às terças e quintas nos portais VIOLA VIVA e CASA DOS VIOLEIROS).

ARAÚJO, João. Linha do Tempo da Viola no Brasil: a consolidação da Família das Violas Brasileiras. 2021. Monografia (Premiação Pesquisas Secult MG – Lei Aldir Blanc). Belo Horizonte: Viola Urbana Produções, 2021.

ARAÚJO, João; VIREDAZ, Rémy (supervisor de traduções). Chronology of Violas according to Researchers. [artigo independente]. Belo Horizonte: Viola Urbana Produções, 2022.

AGRICOLA, Martinus. Musica Instrumentalis. Wittenberg: Georg Rhau, 1542 [1529].

BOCCACIO, Giovani. Decameron. Milano: Giuseppe Reina, 1849.

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