A LUA E A VIOLA

“Crônicas do Viola,” de André Viola.

A LUA E A VIOLA

A noite no sertão é um espetáculo à parte, e a lua, sempre imponente, reina absoluta no céu. 

Dizem que quando ela está cheia, a paisagem ganha outra vida, como se a luz prateada despertasse memórias antigas. 

As histórias que rondam a lua, em noites assim, são tantas quanto as estrelas que brilham ao seu redor.

Sentado na varanda, com a viola em mãos, o velho Zé olhava para o céu e se lembrava das histórias que seu pai contava. 

Havia lendas de lobisomens que corriam soltos pelos campos, com o brilho lunar iluminando suas transformações. 

As crianças da vizinhança tinham medo, mas Zé? Zé sempre soube que a lua não era só isso.

“É verdade que tem lobisomem, mas a lua é muito mais do que isso”, ele pensava enquanto dedilhava sua viola. 

A lua, afinal, também era cúmplice das grandes paixões. 

Foi sob a sua luz que ele viu pela primeira vez Maria, a menina mais bonita do vilarejo. 

O brilho no rosto dela naquela noite parecia ser parte da própria lua, e desde então, todas as vezes que Zé cantava, ele sentia que a lua e sua viola conversavam em segredo.

A lua, pensava ele, guarda mistérios. 

De dia, ela desaparece, quase como se não quisesse ver o que acontece no mundo. 

Mas à noite, ela reaparece, brilhando para iluminar tanto os medos quanto os sonhos. 

Assim como a viola que, nas mãos certas, conta histórias de dor e alegria, a lua também sabe de todos os segredos.

Era engraçado como a viola e a lua tinham tanto em comum. 

Ambas silenciosas, mas capazes de falar direto ao coração. 

Zé acreditava que toda vez que ele tocava, a lua também ouvia, quem sabe até chorava, iluminando o sertão com sua melancolia suave.

E assim, naquela noite, enquanto as histórias assustadoras continuavam a rondar os ouvidos mais jovens, Zé, com sua viola, cantava uma moda de amor para a lua. 

Afinal, era ela que sempre acompanhava os apaixonados e os solitários. A lua e a viola, dois mistérios antigos que, juntos, transformavam qualquer noite no sertão em pura poesia.

THE MOON AND THE VIOLA

The countryside night is a show of its own, and the moon, always majestic, reigns supreme in the sky. 

They say that when it’s full, the landscape transforms, as if the silver light awakens old memories. 

The stories that surround the moon on nights like these are as many as the stars that sparkle around her.

Sitting on the porch with his viola in hand, old Zé, a countryman at heart, looked up at the sky, recalling the tales his father once told him. 

There were legends of werewolves running wild through the fields, with the moonlight illuminating their transformations. 

The children in the village feared those stories, but Zé? Zé always knew the moon was more than that.

“Sure, there may be werewolves, but the moon is much more than that,” he thought as he strummed his viola. 

The moon, after all, was also a partner in great romances. It was under her light that he first saw Maria, the prettiest girl in town. 

Her face seemed to glow that night, almost as if the moon herself had blessed it, and ever since, every time Zé played, he felt as if the moon and his viola shared a secret.

The moon, he thought, holds many mysteries. 

By day, she hides away, almost as if she doesn’t want to see what happens on Earth. But at night, she reappears, shining down to illuminate both fears and dreams. 

Just like the viola, which in the right hands, tells stories of sorrow and joy, the moon, too, knows all the secrets.

It was funny how much the viola and the moon had in common. 

Both were silent but spoke straight to the heart. Zé believed that every time he played, the moon was listening, maybe even shedding a tear, lighting up the countryside with her gentle sadness.

And so, that night, while the scary stories continued to stir the younger ones, Zé, with his viola, sang a love ballad to the moon. 

After all, it was she who always accompanied both the lonely and the lovers. The moon and the viola—two ancient mysteries that, together, turned any night in the countryside into pure poetry.

COMPARTILHE
Facebook
WhatsApp
X

CRÔNIAS DO VIOLA

UM SIMPLES ENCONTRO COM A VIOLA

  “Crônicas do Viola,” de André Viola. UM SIMPLES ENCONTRO COM A VIOLA Naquela manhã de céu limpo, o cheiro da terra molhada ainda pairava no ar, lembrança da chuva que acariciara o...

A LIDA E O CAFÉ COM RAPADURA

“Crônicas do Viola,” de André Viola. A LIDA E O CAFÉ COM RAPADURA Ainda estava escuro quando o primeiro estalo da lenha rompeu o silêncio da madrugada. O cheiro do café fresco...

NOITE DE LENDAS

  “Crônicas do Viola,” de André Viola. SACI E CURUPIRA Lá vem ele, o Saci, pulando num pé só com um sorriso maroto no rosto, brincando de assustar quem se atreve a encarar a noite no...

A LUA E A VIOLA

  “Crônicas do Viola,” de André Viola. A LUA E A VIOLA A noite no sertão é um espetáculo à parte, e a lua, sempre imponente, reina absoluta no céu. Dizem que quando ela está cheia, a...

O SONHO DE UM RANCHINHO

  “Crônicas do Viola,” de André Viola. O SONHO DE UM RANCHINHO Há dias em que sinto que o mundo pede uma pausa. Nesses momentos, imagino uma vida mais tranquila, longe da correria, em...

O CARREIRO E A VIOLA

“Crônicas do Viola,” de André Viola. O CARREIRO E A VIOLA Era fim de tarde na roça, o sol tingia o horizonte de laranja e vermelho, e a calmaria do campo era quebrada apenas pelo som...

A VIOLA E O VIOLEIRO

“Crônicas do Viola,” de André Viola. A VIOLA E O VIOLEIRO A história da viola e do violeiro começa muito antes do primeiro acorde. No meio dessa conexão mágica entre o talento e a terra...

O CORAÇÃO DA ROÇA

“Crônicas do Viola,” de André Viola. O CORAÇÃO DA ROÇA Naquela roça simples, o tempo parecia parar.  A cozinha, sempre movimentada e acolhedora, era o centro de tudo.  O fogão a lenha...

A DESTRUIÇÃO DA TERRA

“Crônicas do Viola,” de André Viola. A DESTRUIÇÃO DA TERRA O caboclo da roça sempre viveu em harmonia com a terra. Plantava no tempo certo, colhia com fartura e compartilhava com os...